quinta-feira, 15 de outubro de 2009

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mas sempre actuais...

Roberto Vinagre

1 comentário:

  1. " A Morte de Peartree Grass" - folhetim neo-realista premonitório, publicado no "Viana & Tal" de boa memória em Fevereiro de 2008:

    .........

    Depois de uma longa vida de excessos e desregramentos, finou-se Peartree Grass num radioso fim de tarde de domingo. Por acaso e só por acaso, dia de eleições locais. Convicto do salvo- conduto que lhe conferia a sua condição de cristão, católico e irmão da misericórdia, dirigiu pronta e decididamente o seu pesado voo para cima, para as portas do céu. Duas pancadas sonoras na enorme aldraba do etéreo portão fizeram saltar S. Pedro, no outro lado, da pachorrenta sonolência a que se entregara.
    - Quem bate assim tão desalmadamente? - Pergunta o santo porteiro, entreabrindo o postigo.
    - Sou eu…
    - Eu quem?
    - Eu, Peartree Grass. Vai dizer ao teu Patrão que já cheguei.
    - E que queres tu, alma deste mundo?
    - Quero entrar. Entrar e ocupar o lugar a que tenho direito. Em vida, como sabes, fui um grande eleito. Aqui terei certamente direito a um lugar no Conselho Geriátrico do Celeste Condomínio!
    - Haa… bom… deixa lá ver.
    Com gestos titubeantes, abre então S. Pedro o Grande Livro á sua guarda. E ajeitando as velhas cangalhas na ponta do nariz, inquire:
    - Como dissestes mesmo que te chamavas?
    - Já lhe disse. Grass, Peartree Grass. Da grande família dos Grass, conhecidíssimos no meu país por sobreviverem a todas as convulsões, revoluções e inquirições, por paparem toda a sorte de sapos e não apanharem indigestões…
    Percorre S. Pedro vagarosamente a letra guê, uma vez, duas, vezes, três vezes. Em vão, pois o nome teima em não aparecer. Impacienta-se agora Peartree.
    - Despacha-te homenzinho e deixa-me entrar. Se fosses meu empregado, já te tinha levantado um processo e mandado para o estaleiro!
    Uma vez mais se debruça S. Pedro sobre as páginas amarelecidas do rol dos bons. Mas não, o nome não está lá, tem agora a certeza.
    - Ná, tu não constas aqui no meu livro. Em definitivo, o teu lugar não é aqui entre os justos.
    - Impossível, não acredito – afirma Peartree com os olhos já avermelhados de raiva. – O padre Manwell tinha-me garantido, prometido, afiançado…
    - Vai e que o Chefe tenha piedade da tua alma… vai…
    Com um gesto seco, o Santo Guardião das Chaves fecha o postigo e regressa à sua doce soneca. Atónito e sem acreditar no que lhe está a acontecer, Peartree Grass sabe agora que o seu lugar é o Purgatório, o domínio dos ANJOS.

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